sexta-feira, 27 de abril de 2007

entretanto antes chegar verso final compreendido não sairia nunca quarto estava previsto cidade espelhos (miragens) arrasada vento desterrada memória homens instante Aureliano Babilonia acabasse decifrar pergaminhos tudo escrito irrepetível sempre todo sempre estirpes condenadas cem anos solidão não tinham segunda oportunidade terra

isso é horrível. isso é leitura dinâmica.
por que deveria eu ler uma bíblia em seis horas?
seis horas de piscadas vagas, movimentos ritmados e entendimento lógico.
não seria melhor escolher um livro, calmamente na prateleira, sentar, ler as sinopses, analisar o próprio estado de espírito e, a partir daí, pegar um, deitar no sofá, coçar a cabeça, preparar um guaraná, sentir o cheiro de mofo das páginas, ver quantas serão necessárias até o clímax, ter vontade de adiantar o final, dormir, sonhar com os personagens, acordar, ler mais um pouco, atender o telefone e falar sobre o livro, desligar, ler de novo, chegar ao clímax, sorrir, absorver os sentimentos escritos e se irritar com o fim?

esse povo tem mania de fazer as coisas ao contrário. pra quê agilizar uma boa leitura? por que não agilizar a justiça, as filas, os ônibus, a burocracia, os velhinhos sem saúde, a polícia, as centrais de informações, as aulas de matemática, o tempo do condicionador nos cabelos, as pausas entre as músicas de um cd, a fusão da água?

"Entretanto, antes de chegar ao verso final já tinha compreendido que não sairia nunca daquele quarto, pois estava previsto que a cidade dos espelhos (ou das miragens) seria arrasada pelo vento e desterrada da memória dos homens no instante em que Aureliano Babilonia acabasse de decifrar os pergaminhos e que tudo o que estava escrito neles era irrepetível desde sempre e por todo o sempre, porque as estirpes condenadas a cem anos de solidão não tinham uma segunda oportunidade sobre a terra".

isso é uma beleza. é g.g.m.

quinta-feira, 26 de abril de 2007

menino quase

calça folgada. blusa rasgada. tênis encardido.
cabelo curto e grande na mesma cabeça. caretas. pesar de ombros.
cérebro preguiçoso. olhos atentos à descontração. risos solitários, insanos.
respostas impensadas. ironia imunda. boca podre.
incostância do cabelo. desleixo proposital. sorriso vencedor.
olhos. mãos. sentidos.
e ao que parece, não única.

fazer não fazendo

- bom dia.
- oi.
- BOM DIA.
- oi.
- tás estranha.
- sou assim mesmo.
- aconteceu alguma coisa.?
- sim.

(...)

- o quê?
- o que o quê?
- o quê aconteceu pra ti tá estranha?
- já disse que sou assim.
- não era assim há dois dias atrás.
- há dois dias atrás eu tava estranha.
- poisé...
- poisé o quê?
- tava estranha. desde há dois dias atrás.
- não. eu tava estranha porque não tava estranha.
- é, tu és estranha mesmo.
- é, é o que me dizem.

os que se julgam observadores e compreensivos do comportamento humano, sabe deus o que são - estranhos. os que se mostram sempre disponíveis e confortadores, sabe se lá porque fazem tanta capa - mascarados. os que se recolhem, sabe-se que são estranhos - mentirosos.

quinta-feira, 5 de abril de 2007

de repente, não mais que de repente

eu me pego e olho.
e suspiro. e prendo a respiração até me dar conta que eu não posso viver sem ar.
de vez em quando, eu pego e finjo.
dou risada, falo bobagens e olho não vendo.
às vezes eu me pego fazendo coisas premeditadas.
friamente calculadas.
e até, em vão.
me pego e me olho, detetive.
fuçadora, orkuteira.
e ainda, sonsa.
de repente, não deveria nem pegar.
só olhar.
esperar.

de repente, pega e olha, e finge e suspira.